O Brasil está em negociações para se tornar um dos produtores mundiais da vacina contra a covid-19 que está sendo desenvolvida pela Universidade de Oxford em parceria com a AstraZeneca. A produção brasileira abasteceria toda a América Latina. O acordo do governo com a iniciativa privada colocaria o país na dianteira, em um momento em que corria o risco de estar no fim da fila da vacina.
A AstraZeneca anunciou ontem que já fechou acordos internacionais para a produção de 1,7 bilhão de doses e segue em busca de novos parceiros. Os acordos já firmados são com o Reino Unido, os Estados Unidos, a CEPI (Coallition for Epidemic Preparedness Innovations), a Aliança de Vacinas (Gavi) e o Instituto Serum, da Índia. Mas ainda há uma capacidade adicional de produção de 300 milhões de doses para alcançar o objetivo de ter um ponto de partida de 2 bilhões de doses. Para além dessa meta inicial, o objetivo é continuar buscando parceiros.
“Já há negociações com diferentes governos de diferentes países, entre eles o Brasil”, afirmou a infectologista brasileira Sue Ann Clemens, diretora da Iniciativa Global de Saúde da Universidade de Siena e pesquisadora da Unifesp, que está coordenando os centros de testagem da vacina no Brasil. “Essa é uma oportunidade muito grande para o nosso país não só no campo da pesquisa clínica, mas também na produção de imunizantes.”
Para a pesquisadora, tanto o Instituto Butantã, em São Paulo, quanto a Fiocruz, no Rio, têm plena capacidade e reconhecimento internacional para produzir as vacinas necessárias não só para o Brasil como para toda a América Latina. A grande vantagem de se ter uma produção local, segundo Clemens, para além da transferência de tecnologia, seria o acesso mais fácil e mais rápido ao imunizante. “Até meados do ano que vem já teríamos a vacina pronta para ser aplicada”, afirmou a infectologista, que também é consultora da Fundação Bill e Melinda Gates para imunizantes.
O Brasil estava sob o risco de ser um dos últimos a ter acesso a vacina. As decisões polêmicas do governo de Jair Bolsonaro sobre a hidroxicloroquina e as medidas de isolamento, bem como as trocas dos ministros da Saúde, fizeram com que o país sequer fosse convidado para o lançamento da “Colaboração Global para Acelerar o Desenvolvimento, Produção e Acesso Equitativo a diagnósticos, tratamento e vacina contra o covid-19”, no fim de abril, na Organização Mundial de Saúde (OMS).
O acordo privado pode alterar essa circunstância. Segundo a pesquisadora, ao Brasil também foi oferecida a primazia na compra de doses da vacina. “Essa foi uma das primeiras perguntas que eu fiz para o Andrew (Pollard, que coordena o desenvolvimento da vacina de Oxford), quando ele me ligou, pedindo que fizesse a ponte para fazermos testes no Brasil: se teríamos acesso prioritário”, contou Clemens. “Ele respondeu que isso estava em discussão, mas que a capacidade de produção deles era limitada. Depois disso, no entanto, eles firmaram o acordo com a AstraZeneca, ampliando a capacidade de produção. Sei que o Brasil já tem em mãos uma ordem de compra e que foi um dos primeiros países abordados para a possibilidade de produção local.”
Das mais de 100 vacinas contra a covid-19 em desenvolvimento hoje no mundo, a de Oxford é a que está na fase mais avançada das testagens, a 3, que vai aferir a eficácia do imunizante em pelo menos 10 mil pessoas. A meta dos pesquisadores é conseguir antes do fim deste ano um registro provisório da vacina e um sinal verde dos órgãos reguladores para seu uso em caráter emergencial.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo