Quando encontrou um caroço em sua mama esquerda durante uma autoavaliação de rotina, a Dra. Devon Quasha, médica de cuidados primários de Boston (EUA), sabia exatamente o que fazer. Ela imediatamente agendou uma mamografia diagnóstica e ultrassom no Hospital Geral de Massachusetts para o início de janeiro.
Depois disso, a vacina da Moderna passou a ser disponibilizada aos profissionais de saúde da cidade. Ela recebeu a primeira dose da vacina contra a Covid-19 cerca de uma semana antes de sua mamografia programada.
Quasha não notou muita reação à vacina no início, mas alguns dias antes da consulta, seu braço esquerdo começou a doer. Nódulos sensíveis e inchados desenvolveram-se sob a axila esquerda, junto com um grande inchaço acima da clavícula.
“Você tem nódulos linfáticos acima e abaixo da clavícula”, disse Quasha. “Você não quer sentir isso. Foi assustador quando eu senti”.
Os gânglios linfáticos contêm células imunológicas que ajudam a combater os invasores. É por isso que fazia sentido para a Quasha que os nódulos estivessem reagindo à vacina, construindo anticorpos como deveriam. Mas ela não tinha certeza.
O inchaço estava apenas no lado esquerdo, onde ela havia tirado a injeção – o mesmo lado do caroço preocupante. Foi uma reação à vacina ou outro sinal de câncer de mama?
‘Foi como um incêndio’
Depois do ultrassom, o radiologista de Quasha ficou preocupado. Ele disse a Quasha que considerava o caroço no seio pouco significativo, mas os gânglios linfáticos que apareciam como bolhas brancas em sua mamografia eram outra história.
Em tempos não pandêmicos, essa descoberta dispararia o alarme, exigindo a necessidade de mais investigações, até mesmo uma biópsia imediata. No entanto, Quasha tinha acabado de receber a vacina. Depois de conversar com ela sobre o assunto, o médico decidiu não fazer uma biópsia naquele momento. Em vez disso, ele recomendou a Quasha voltar para um ultrassom de acompanhamento em seis semanas.
Cenários semelhantes vinham acontecendo em centros de mamografia em todo os Estados Unidos. Conforme os radiologistas comparavam as anotações com os colegas, a notícia começou a se espalhar.
“Todos nós começamos a falar sobre isso, e foi como um incêndio”, disse a Dra. Connie Lehman, chefe de exames de imagem da mama do Hospital Geral de Massachusetts.
“Eu não posso dizer quantas mulheres estão mostrando nódulos nas mamografias e as pessoas pensaram que não seria tão comum”, afirma Lehman, que também é professora de radiologia em Harvard.
Histórias de biópsias desnecessárias estimularam a divulgação de um aviso realizado pela Sociedade de Imagem da Mama dos Estados Unidos (https://www.sbi-online.org/Portals/0/Position%20Statements/2021/SBI-recommendations-for-managing-axillary-adenopathy-post-COVID-vaccination.pdf), em janeiro: Pergunte a seus pacientes sobre o status de Covid-19 e registre a data e qual braço recebeu a vacina. Considere isso antes de agendar automaticamente uma biópsia.
“Queríamos defender que as mulheres nem sempre precisam de uma biópsia”, disse o Dr. Lars Grimm, professor associado de radiologia da universidade Duke e um dos autores do comunicado. “Porque muitas vezes o padrão, se você ver nódulos linfáticos inchados em uma paciente, seria realmente recomendar fazer uma biópsia”.
Lehman, do Hospital de Massachusett, concordou. “Quando você ouvir cascos, não pense em zebra”. Para ela, “se a mulher recebeu uma vacina no braço do mesmo lado e os gânglios linfáticos estão inchados, esta é uma resposta biológica normal. É totalmente esperada. Simplesmente não faz sentido começar a imagiologia”.
Isso não significa que as mulheres que desejam ter certeza sobre seu status de câncer não possam fazer uma biópsia, enfatizou Grimm.
“Você realmente tem algumas mulheres que querem fazer uma biópsia”, destacou o professor. “Você pode dizer a eles: ‘Ei, acho que isso se deve à sua vacina contra a Covid e tenho certeza que vai se resolver em algumas semanas por conta própria e vai ficar bem’. Mas aquela paciente lhe diz: ‘Não vou ficar confortável esperando, quero saber agora’”.
Concentração na triagem para salvar vidas
Para Quasha, saber que muitas mulheres estavam experimentando o mesmo tipo de reação à vacina foi um alívio bem-vindo em meio a preocupação. Após conversar com seu médico, ela não precisa mais de exames de acompanhamento.
“Fiquei muito tranquila”, disse Quasha. “O ponto aqui é que há uma série de efeitos colaterais da vacina que não são perigosos, mas às vezes podem aumentar a ansiedade do paciente”.
Segundo Lehman, em vez de trazer as mulheres de volta para um ultrassom desnecessário, os centros de radiologia devem se concentrar no agendamento de quem perdeu ou está atrasada com a sua mamografia.
“Precisamos cuidar da grande porcentagem de mulheres que não foram examinadas por causa das paralisações durante a Covid”, disse a chefe de exames de imagem da mama. “Só no Hospital de Massachusett, não conseguimos rastrear 15.000 mulheres por causa da pandemia, e ainda estamos tentando trazê-las de volta.
“Não é aqui que preciso começar a fazer ultrassom axilar, porque alguém tomou uma vacina e o nódulo inchou. Não se trata de ser prático ou pragmático ou colocar as necessidades do paciente em primeiro lugar”, disse ela.