Uma rotina do bem que começa cedo para garantir o pão e o almoço de milhares de pessoas no Distrito Federal. Assim tem sido o dia a dia nos 14 restaurantes comunitários espalhados por cidades como Ceilândia, Estrutural, Planaltina, Samambaia, São Sebastião, Paranoá e Brazlândia. O batente para quem tem que deixar tudo preparado para a primeira refeição diária, o café da manhã, começa às 5h40, com bandejas servidas às 6h40.
São pessoas de baixa renda ou em situação de vulnerabilidade social que têm à disposição refeições adequadas e saudáveis a preços acessíveis. O cardápio do desjejum do dia era pão com ovo, café com leite e uma fruta, no caso, mamão, ao custo módico de R$ 0,50.
“Sempre que posso, venho aqui. Hoje, por exemplo, não tinha nada para comer lá em casa; como fica perto, em 15 minutos estou aqui”, conta a aposentada Ana Pereira dos Santos, 60 anos, que ganha a vida como vendedora de roupa em brechós. “É uma ideia criativa para as pessoas de baixa renda. As coisas hoje em dia estão muito caras”, pondera.
Alunos do Centro de Ensino Médio 2, que fica quase calçada com calçada com o Restaurante Comunitário de Brazlândia, na Quadra 36 da Vila São José, aproveitam as vantagens do espaço. “É bem acessível para muita gente; para nós é legal não apenas por ser perto da escola, mas pelo preço também”, observa a estudante, Thynan Dantas, 17 anos, que forrava o estômago com um honesto café antes de ir para a escola. “É um serviço para toda a sociedade, não apenas para quem precisa”, comenta o colega João Pedro Gurgel, 16 anos.
Enquanto cerca de 150 pessoas fazem o desjejum pela manhã no hall do restaurante, na cozinha, cozinheiras e ajudantes esforçados se revezam desde as primeiras horas do dia para preparar o almoço do dia. No forno industrial, 16 bandejas gigantes assam desde as 7h a carne do dia, coxa e sobrecoxa, peça que irá acompanhar o arroz com açafrão e feijão carioca, ambos preparados em enormes panelas de pressão. Noutra parte da área, um grupo de três ajudantes preparam salada e guarnições, como chuchu com milho e cheiro verde.
Na unidade de Brazlândia, em média, são preparados cerca de 200 kg de arroz e entre 60 kg e 70 kg de feijão por dia, comida que atende cerca de 1,5 mil pessoas diariamente. O cardápio de cada dia é elaborado com um mês de antecedência por nutricionistas da empresa que fornece os alimentos, em parceria com os nutricionistas da Secretaria de Desenvolvimento Social (Sedes).
Capilaridade assistencial
Para se ter ideia da capilaridade desse serviço social, segundo dados da pasta, entre 2019 e 2021, mais de 7, 6 milhões de refeições foram ofertadas nos 14 espaços do DF, o que corresponde a mais de R$ 101 milhões de execução orçamentária. Em 2022, só de almoços servidos até março, de acordo com dados do órgão, foram mais de 2 milhões, sendo quase 50 mil só de refeições gratuitas para pessoas em situação de rua. O total de café da manhã fornecido foi mais de 155 mil, somando quase R$ 12 milhões de recursos.
“O decreto (nº 40.854, de 5 de junho de 2020) estabelece somente a gratuidade do almoço para as pessoas em situação de rua, mediante comprovação. E como é feita essa comprovação? Se cadastrando no Centro de Referência de Assistência Social (Cras). Com o nome registrado no sistema, fazemos esse controle”, explica o gerente do Restaurante Comunitário de Brazlândia, Sidon Francisco.
“A política de segurança alimentar e nutricional, juntamente com a política de assistência social, garantem o direito da população a esse serviço, permitindo que famílias e pessoas em situação de rua tenham como se alimentar. É uma diferença incrível que faz na vida dessas pessoas”, defende a assistente social da Sedes Kariny Alves.
Qualidade nutricional
O desafio é definir uma alimentação de qualidade, com produtos seguros e ricos em nutrientes. É o que explica Thaynara Alves de Sousa Nogueira, nutricionista da Sedes. Ela integra o grupo de profissionais da área recém-nomeados pela atual gestão. Agora, cada um dos 14 restaurantes comunitários do GDF conta com uma nutricionista.
“O cardápio tem que garantir alimentação de qualidade para a população em situação de vulnerabilidade, que seja uma alimentação segura e também benéfica”, defende a nutricionista. “Nos preocupamos muito com a qualidade nutricional, sempre pensamos numa opção mais saudável. Por exemplo, geralmente deixamos mais fruta na sobremesa do que doce porque é mais saudável”, detalha.
Para garantir a segurança dos alimentos, os servidores dos restaurantes comunitários do DF obedecem a regras e protocolos de higiene rigorosos. Além do avental, o uso de máscaras e toucas é obrigatório. Em atividades nas quais não é necessário o uso de luva, recomenda-se a higienização das mãos constantemente. Já a limpeza das mesas em que os comensais se alimentam é feita logo que cada um deles termina sua refeição.
“E acabou a parte do café da manhã, a gente faz a limpeza geral do ambiente para deixar tudo pronto para o pessoal do almoço”, informa Sidon.
Pouco antes das 11h, quando o almoço começa a ser servido para a comunidade, filas começam a crescer no Restaurante Comunitário de Brazlândia. Não é sempre que frequenta o espaço, mas, quando vai, o pedreiro aposentado Edson Jorge Filho se esbalda com as duas marmitas que prepara para levar para casa. “Não tenho o que reclamar, é uma ajuda muito grande que o governo dá para as pessoas mais carentes”, agradece. “Você vai numa padaria, paga R$ 10 e ainda sai com fome. Aqui você vem com R$ 1 e vai embora de barriga cheia”, diz.